Recentemente, o Cláudio publicou uma notícia vinda da CNN, indicando que, no ano passado, 43 bilhões de pontos de cartão de crédito expiraram por falta de uso. Baseado nesta notícia eu decidi escrever este artigo sobre a evolução dos cartões de crédito no Brasil na última década.
Mais uma vez agradecemos ao nosso querido leitor Carlos que nos brinda com outra brilhante análise.
O Banco Central publica, anualmente, dados coletados sobre os arranjos de pagamentos utilizados no Sistema Brasileiro de Pagamentos. A definição exata do que isto quer dizer pode ser conferida aqui.
O interessante é que os dados permitem termos uma ideia de como foi a evolução do mercado de cartões de crédito no Brasil na última década.
Os Cartões de Crédito no Brasil na Última Década
Normalmente, esta análise seria uma tarefa para economistas ou especialistas em finanças. Mas como nem estes profissionais já tiveram a brilhante e totalmente excelente 😛 ideia de fazer uma correlação entre índices econômicos e bônus de transferência de cartões de crédito, não seria agora que iriam se tornar necessários.
Quantidade de Cartões de Crédito
De 2010 a 2017, vemos uma oscilação mais ou menos regular na quantidade de cartões emitidos, ocorrendo, a partir de 2018, uma forte expansão deste total. Veremos em seguida os responsáveis por isso, mas é de se esperar que este aumento significativo tenha continuidade com os diversos lançamentos de cartões de fintechs, cooperativas de crédito e estabelecimentos bancários virtuais.
É interessante notar que pouco mais da metade dos plásticos (ou metais, para os raros portadores) emitidos são ativados. Isto acontece tanto com aquele Gold básico que nem vale o trabalho de desbloqueio quanto com aquele caro que você pede no lançamento mas não tem coragem de desbloquear para não desperdiçar dinheiro.
Cartões de Crédito Ativos por Arranjo de Pagamento
Temos aqui dados interessantes sobre as bandeiras dos cartões de crédito. Reparem que a Visa, em 10 anos, manteve estável sua quantidade de cartões, enquanto seu principal concorrente mundial, a Mastercard, aumentou em mais de 70% sua base de cartões e foi o principal responsável pela expansão citada anteriormente.
Chamam atenção os cartões Amex, que a partir de 2011 iniciam um processo de declínio de cartões ativos e pareciam se encaminhar para a liquidação de suas operações no Brasil, como aconteceu com o similar americano Diners.
Mas em 2019, há uma forte recuperação da base, provavelmente baseada na alta emissão de cartões Amex promovida pelo Bradesco, através de consultores, e de sua oferta com dois anos de anuidade gratuita na Semana do Consumidor do ano passado. Até temos, agora, a previsão da bandeira passar a ser comercializada também pelo Santander, futuramente.
Temos ainda o crescimento sólido e robusto da bandeira Elo, desde o seu lançamento em 2010 (com apenas 5 cartões ativos!) e a explosão, a partir de 2018, de cartões de bandeira própria (de estabelecimentos comerciais, provavelmente), ambos os outros responsáveis pelo enorme crescimento de cartões citados acima.
Quantidade de Cartões de Crédito Ativos no Brasil por Categoria de Produto
Vemos aqui que a quantidade de cartões básicos manteve-se relativamente estável em 10 anos, enquanto os segmentos intermediário (platinum, por exemplo) e premium (infinites, black…) aumentaram em cerca de 200%. Destaque para os quase 400% de crescimento dos cartões corporativos, que são um ramo pouco noticiado do mercado.
Baseado nos dados anteriores, podemos inferir que os cartões Mastercard Platinum e Black e Elo Grafite e Nanquim devem ter sido os principais produtos que conquistaram a maior parte do aumento do mercado de cartões.
Quantidade de Transações com Cartões de Crédito no Brasil por Arranjo de Pagamento
Temos nos dados abaixo um crescimento de quase 200%, na década, na quantidade de transações domésticas com cartões de crédito. E, seguindo a lógica da base de cartões, Visa cresceu abaixo disso, com “apenas” 90%, contra mais de 300% da Mastercard.
Transações Domésticas
Transações no Exterior
Já as transações internacionais são bem mais afetadas pelo desempenho econômico nacional, assim como a cotação do dólar. Apesar de termos fechado a década com cerca de 25% de crescimento neste quesito, ficamos abaixo no desempenho verificado em outros anos, especialmente 2014, quando a cotação do dólar ainda estava abaixo de R$ 2,50. Mas chama atenção também o ano de 2017, que teve o mesmo quantitativo de 2013, mesmo com o PIB e o dólar estando significativamente piores quatro anos depois.
Vemos ainda um declínio da bandeira Visa nesta área, contra um crescimento vigoroso da Mastercard. De líderes do mercado, em volume, no começo da década, chegaram em 2019 perdendo por muito a liderança para seu principal concorrente.
Transações com Cartões de Crédito por Categoria de Produto – 2019
Estes dados são mais uma curiosidade dos segmentos dos cartões. O perfil premium possui média de gastos cerca de 50% superior ao intermediário e básico, que em nada se diferem. Em termos de retorno em transações, as instituições financeiras nada conseguem no segmento intermediário, motivo pelo qual vemos o foco em lançamento de novos produtos na linha premium.
Quantidade de Transações
Valor da Transações
Valor Médio das Transações
Novamente, o segmento corporativo apresenta desempenho significativamente superior, mas este não parece ser um perfil muito ligado ao mundo das milhas, ao contrário do mercado norte-americano e europeu.
Gastos com Programas de Recompensas pelos Emissores de Cartões de Crédito no Brasil
Finalmente, chegamos nos dados mais interessantes para o mundo dos pontos e milhas. Em termos de estoque de pontos, terminamos a década com a quarta quantidade mais baixa, apesar de termos batido o recorde de pontos adquiridos. O estoque diminui porque convertemos e deixamos expirar mais pontos.
Muitos pontos foram jogados no lixo, mas tivemos três anos bem piores que o último (tanto em termos absolutos quanto relativos). Em termos de conversão, quase batemos o recorde de 2016, mas em termos de eficiência, já tivemos dois anos bem melhores que o último.
Me chama a atenção o recorde da aquisição de pontos, quando a atividade econômica se encontra estagnada há anos e o aumento constante da cotação do dólar impacta negativamente na quantidade de pontos auferidos nas transações com cartões.
Acredito ser por causa da forte expansão na base de cartões ativos, citada anteriormente. Isto compensou os dados econômicos ruins. Poderíamos já ter tido uma explosão nesta aquisição se em 2019 a atividade econômica e o dólar não tivessem jogado contra (e imaginem o tsunami que serão estes dados de 2020, com os recordes de queda do PIB e alta do dólar).
Correlações entre Pontos Convertidos e Expirados
Em 10 anos, nos tornamos bem mais eficientes na conversão, em passagens aéreas ou produtos (como cafeteiras), dos pontos (média de 68%) adquiridos por compras com cartões de crédito, mas já fomos bem melhores neste quesito.
Da mesma forma, ainda não aprendemos, de forma eficaz, a controlar a validade dos pontos e garantir que este custo, embutido no produto cartão de crédito, nos dê o maior retorno econômico possível, ao invés de virar e aumentar a parte dos lucros das operadoras dos cartões.
Note que estas empresas, apesar de chiadeiras ocasionais, fecharam a década com o maior gasto em recompensas, mas foram igualmente recompensadas pela maior receita com tarifas.
Em termos proporcionais, o último ano teve a terceira proporção mais baixa de custo x arrecadação, sendo a média da década de 38%. Ou seja, estas empresas ainda têm alguma gordura para queimar.
Algumas Palavras
Em 10 anos, vimos uma melhoria nos benefícios oferecidos pelos cartões de créditos somente no segmento premium, basicamente atrelados ao acesso a lounges aeroportuários. São, entretanto, poucos os cartões que oferecem acesso gratuito em quantidades significativas a seus clientes. A maior parte só oferece o acesso pago (grande coisa!) ou irrisórias duas ou quatro visitas gratuitas anuais.
Em termos de pontuação, os cartões estão oferecendo muito menos do que ofereciam no começo da década. É um pouco desanimador ver diversos lançamentos de novos produtos no mercado que são nada mais do que cópias do que já existe em abundância por aí.
Continuamos com um cartão do segmento intermediário dando banho nos “superiores” habitantes do segmento premium.
E, em época de crise, vimos poucas tentativas das empresas em compensar ou recompensar seus clientes. Os cartões, pela cotação do dólar, pontuaram ainda menos e os principais benefícios dos cartões (na maior parte, ligados a viagens e deslocamentos aéreos) tornaram-se de utilização bastante restrita.
Novamente, os gastos das empresas com recompensas foram proporcionalmente menores em 2019 e, provavelmente, despencarão em 2020 (em proporção muito maior do que na receita com tarifas).
A minha impressão é que, no cômputo geral do mundo das milhas e pontos, iniciamos o ano de 2020 em situação pior que do ano de 2010, relativo ao produto cartões de crédito. O tempo passou na janela e as Carolinas, pelo demonstrado, não viram.
Agradecemos mais uma vez ao Carlos pela valiosa contribuição para os leitores do Passagens.top!
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